19 de março de 2011

Para dar o que pensar...

Hoje Assim Assado deixa, só um pouquinho, de lado as amenidades da vida e sugere um momento de introspecção. Beleza pode e está em diversos segmentos e sempre estará na poesia.
Porque não vivemos apenas na/da superficialidade, transcrevemos aqui um belo poema do poeta maior, Ferreira Gullar:


"Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca


Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio


Que a música que ouço ao longe
Seja linda, ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo
Seja pra sempre amada
Mesmo que distante


Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade


Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
Nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa
Que resta a um homem
Inundado de sentimentos


Porque metade de mim é o que eu ouço
Mas a outra metade é o que calo


Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma
E na paz que eu mereço
E que essa tensão
Que me corroe por dentro
Seja um dia recompensada


Porque metade de mim é o que penso
Mas a outra metade é um vulcão


Que o medo da solidão se afaste
E que o convívio comigo mesmo
Se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita
Em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância


Porque metade de mim
É a lembrança do que  fui
A outra metade eu não sei


Que não seja preciso
Mais do que uma simples alegria
Para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio
Me fale cada vez mais


Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço


Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade
Para faze-la florescer


Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção


E que a minha loucura
Seja perdoada


Porque metade de mim é amor
E a outra metade, também" VL

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